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12.09.2021 | Cerimónias Fúnebres de Estado do Antigo Presidente da República Jorge Sampaio


Senhor Presidente da República,

Queridas Maria José Ritta e Vera e querido André,

Demais Familiares e Amigos de Jorge Sampaio,

Sua Majestade o Rei de Espanha,

Chefes de Estado de Países Amigos e Seus Representantes,

Senhor Secretário-Geral da Organização das Nações Unidas, António Guterres,

Demais Entidades presentes,

Excelências,

Minhas Senhoras e Meus Senhores,


É bem patente, como o demonstram as numerosas intervenções dos últimos dias, a figura ímpar de Jorge Sampaio, que, ao partir aos 81 anos, nos deixa um legado extraordinário.

Como Presidente da Assembleia da República, e neste momento de dor, manifesto o meu profundo pesar à Família de Jorge Sampaio (em particular à sua mulher Maria José Ritta, e aos seus filhos, Vera e André, aqui presentes).

Dor que sinto, pelo amigo de longa data que perdi, e que é partilhada pelos Deputados à Assembleia da República, que aqui represento, e, estou certo, por grande parte dos Portugueses.

Se este é um momento de dor e de tristeza, é também um momento para lembrar quão afortunado foi Portugal por ter tido em Jorge Sampaio um dos seus cidadãos mais ilustres, e que é, desde há muito, e por direito próprio, uma referência política do Portugal democrático.

Jorge Sampaio teve uma intervenção cívica ativa e desempenhou vários cargos na vida pública nacional.

Em todos eles imprimiu a marca dos seus valores humanistas, uma visão progressista e um forte dever cívico.  

Serviu, como poucos, causas justas e a causa pública, antes e depois do 25 de Abril.

Com convicção, combatividade, integridade e uma enorme generosidade.

Como estudante, no combate à ditadura de Salazar, notabilizou-se como um dos principais rostos da crise académica de 1962.

Foi candidato nas listas da oposição democrática da CDE, em 1969, e, já como advogado, assumiu, corajosamente, a defesa de inúmeros presos políticos no Tribunal Plenário da ditadura.

Se teve um papel de destaque na oposição à ditadura do Estado Novo, não foi menos relevante o seu contributo para a consolidação da Democracia de Abril.

Após o 25 de Abril de 1974, Jorge Sampaio foi um dos principais impulsionadores do Movimento de Esquerda Socialista (MES), jornada que com ele partilhei.

Percebeu desde cedo as limitações de intervenção deste projeto, o que o levou, pouco tempo depois, a aderir ao Partido Socialista, enquanto casa comum da esquerda democrática.

Ao longo da sua notável carreira, destacam-se os dois mandatos como Presidente da República, a liderança do Partido Socialista como seu Secretário-Geral, o exercício empenhado como Deputado à Assembleia da República, e, não esqueçamos, como Presidente da Câmara Municipal de Lisboa.

Prestigiou todos os cargos que exerceu, tendo sabido usar a palavra pública e a sintonia que conseguiu alimentar com o Povo Português para gerar verdadeiros compromissos estratégicos.

Como autarca, liderou uma coligação histórica à Câmara Municipal de Lisboa, nas eleições autárquicas de 1989.

Mas o contributo de Jorge Sampaio reflete-se também na forma como soube impulsionar uma nova centralidade das políticas públicas (sobretudo no campo económico e social) no desenvolvimento do País e no combate à pobreza e às desigualdades.

Trouxe a urgência da descentralização, das causas do ambiente e da qualidade da democracia, que viriam a marcar o programa e a governação do PS, mas, também, de outras forças políticas.

A sua vocação humanista levou-o ainda a ser Enviado Especial do Secretário-Geral da Organização das Nações Unidas para a Luta Contra a Tuberculose e Alto Representante da ONU para a Aliança das Civilizações.

E, ainda no plano internacional, a fundar a Plataforma Global de Assistência Académica a Estudantes Sírios.

Foi um socialista dos valores humanitário e da justiça social, para quem "a solidariedade não é facultativa, mas um dever que resulta do artigo 1.º da Declaração Universal dos Direitos Humanos", como nos deixou escrito.

Pela forma íntegra e empenhada como exerceu todas estas funções, colheu um merecido respeito e admiração, dentro e além-fronteiras.

Jorge Sampaio era uma pessoa de grande saber, cultura, inteligência e generosidade.

Alguém que escolheu colocar as suas qualidades ao serviço de causas.

O exemplo de Jorge Sampaio lembra-nos a importância não só de perfilharmos ideias nobres e justas, mas, também, da relevância de intervirmos para melhorar o mundo em que vivemos.

Felizmente, Jorge Sampaio soube fazê-lo, mantendo, até ao fim dos seus dias, uma constante intervenção político-cultural.

No momento do seu desaparecimento, prestemos-lhes a homenagem devida, recordando-o nas suas múltiplas facetas: o grande advogado, o grande político, o enorme ser humano e um dos melhores servidores da causa pública da sua geração.

E, permitam-me, recordando também o amigo.

Ao contrário do que muitas vezes se diz, na política também se fazem amigos. E Jorge Sampaio teve muitos e grandes amigos na política, com quem debateu e partilhou ideias, muitas vezes pela noite dentro, influenciando-se mutuamente, e que marcaram o seu trajeto.

Alguns já desaparecidos, e que hoje faz todo o sentido evocar – como o António Franco, o António Manuel, o António Marques Júnior, o Armando Trigo de Abreu, o Cesar de Oliveira, o Ernesto Melo Antunes, o João Bénard da Costa, o Jorge Galamba, o Lopes Cardoso, o Luís Nunes de Almeida, o Miguel Galvão Teles, o Nuno Brederode Santos, ou o Vítor Wengorovius, para apenas citar alguns queridos amigos.

Jorge Sampaio foi um Ilustre Português e o seu exemplo vai certamente perdurar e inspirar muitas gerações.

Por tudo o que generosamente nos deu, por tudo o que nos ensinou, por tudo o que connosco partilhou, obrigado Jorge Sampaio.

 

Eduardo Ferro Rodrigues

Presidente da Assembleia da República