Bem-vindo à página oficial da Assembleia da República

Nota de apoio à navegação

Nesta página encontra 2 elementos auxiliares de navegação: motor de busca (tecla de atalho 1) | Saltar para o conteúdo (tecla de atalho 2)

23.07.2021 | Conferência Parlamentar “RTP – O futuro do serviço público de rádio e televisão” | Sala do Senado, Palácio de São Bento

A Assembleia da República é, por natureza, o palco central da Democracia.

Enquanto órgão representativo de todos os Portugueses, é nesta Casa que são – que devem ser – debatidos os temas essenciais da Democracia, sobretudo os que se prendem com os nossos direitos, liberdade e garantias.

E aqui está-se no âmago dos valores mais profundos que caracterizam a Democracia consagrada na nossa Constituição – o da liberdade de imprensa e meios de comunicação social.

Apraz-me, por isso, que a Comissão de Cultura e Comunicação tenha tomado a iniciativa de realizar esta Conferência Parlamentar, subordinada ao tema RTP – O Futuro do Serviço Público de Rádio e Televisão.

É, pois, de saudar a Comissão de Cultura e Comunicação, na pessoa da sua presidente, a Deputada Ana Paula Vitorino, pela pertinência deste evento.

A oportunidade desta iniciativa decorre do facto de se encontrar atualmente em curso o processo de revisão do contrato de concessão do serviço público de rádio e televisão celebrado em 2015 entre o Estado e a RTP – Rádio e Televisão de Portugal, S.A., e que foi já objeto de consulta pública, da qual resultaram mais de 2.500 contributos, como revelou recentemente a Senhora Ministra da Cultura aqui no Parlamento, o que é bem demonstrativo do interesse que este assunto suscita na sociedade em geral.

 

Minhas Senhoras e Meus Senhores,

A existência e o funcionamento de um serviço público de rádio e de televisão têm garantia constitucional, inserida na parte da Constituição dedicada aos Direitos, Liberdade e Garantias (artigo 38.º).

A importância deste serviço público para as sociedades democráticas é reconhecida em todas as instâncias internacionais, nomeadamente naquelas de que Portugal é parte, como a União Europeia e o Conselho da Europa.

O serviço público é atribuído pelo Estado, através de contrato de concessão, onde se definem os objetivos visados, se fixam as obrigações específicas da concessionária e se determinam as suas orientações estratégicas.

De entre as obrigações atribuídas à RTP, e que são fundamentais para o cumprimento dos objetivos do serviço público, constam: (i) a promoção da Língua Portuguesa e da Cultura Portuguesa; (ii) a ligação entre Portugal e os Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa; (iii) o reforço da disponibilização de serviços de programas e conteúdos dedicados aos públicos infantis e juvenis; ou (iv) a prioridade à acessibilidade dos serviços e conteúdos audiovisuais às pessoas com necessidades especiais.

A revisão do contrato em discussão tem como objetivo, segundo o Governo, adequar a RTP às mudanças significativas que se têm verificado no setor dos media em todo o mundo, de modo a diversificar a sua oferta através dos conteúdos, dos serviços de programas ou das plataformas com as quais deve chegar a todos os cidadãos de maneira diferenciada.

Estas obrigações, incluindo as agora acrescidas, serão seguramente objeto de discussão nos painéis que se seguirão.

Não posso, contudo, deixar de salientar duas obrigações a que sou particularmente sensível e que entendo como pilares de qualquer Estado de Direito democrático: (i) a imparcialidade e independência da informação e do comentário, e (ii) o combate à desinformação.

Estas obrigações são, forçosamente, duas vertentes da mesma realidade.

 

Minhas Senhoras e Meus Senhores,

Vivemos tempos em que, devido ao desenvolvimento tecnológico, a informação e, inevitavelmente, a desinformação circulam a uma velocidade sem precedentes.

As fontes das notícias são agora inúmeras, mas tal não equivale necessariamente a melhor informação. A notícia sem contextualização e sem interpretação é, invariavelmente, fonte de desinformação, pela perceção imprecisa ou equívoca que origina.

E hoje, qualquer um pode arrogar-se propagador de informação, atendendo aos meios tecnológicos ao seu dispor.

O combate à desinformação faz-se, precisamente, através da informação rigorosa, imparcial e independente, pautada pelos mais elevados padrões jornalísticos.

Os factos devem ser comprovados, ouvindo as partes com interesses atendíveis, e devem ser interpretados e relatados com seriedade, rigor e exatidão, como impõe o Código Deontológico dos Jornalistas.

O critério nos programas de informação no âmbito do serviço público deve ser, assim, tão-só o da relevância da notícia, indiferentemente a pulsões de popularidade ou sensacionalismo.

Não devem estar sujeitos a compromissos, antes de mais, de ordem comercial ou obedecer a meros critérios de audiência, que, em última instância, visam também interesses mercantis.

A preocupação de isenção e de pluralidade deve ainda ser reforçada no caso do comentário, que, pela própria natureza, não está sujeito às regras deontológicas dos jornalistas.

A opinião deve ser claramente percebida pelo público como uma realidade distinta da notícia. E o comentário deve, por sua parte, ser distinto do entretenimento.

O serviço público não se compadece com opinião trasvestida de notícia.

Estas opções têm, naturalmente, implicações financeiras, que terão de ser respondidas e que o contrato de concessão deve acautelar, atento o propósito de se eliminar progressivamente a publicidade do serviço público de televisão em todos os serviços de programas, com exceção da RTP1.

A RTP confronta-se com a forte e agressiva concorrência de canais privados, cuja principal fonte de rendimento é a publicidade, num mercado rarefeito, em que escasseiam meios de financiamento.

E trata-se de uma concorrência desigual, já que a RTP, além do normal serviço de rádio e televisão, sujeito a critérios mais rigorosos, tem também de cumprir as obrigações decorrente do contrato de concessão.

Tem vindo a verificar-se uma fuga da publicidade para as plataformas e redes sociais, a que acresce a disseminação, gratuita, de notícias e conteúdos através desses meios digitais.

Aqui a solução que tem vindo a ser ponderada, e está a ser ensaiada, por exemplo, na Austrália, é a de obrigar os gigantes tecnológicos a partilhar as receitas de publicidade gerada a partir de artigos produzidos pela imprensa e, adicionalmente, a pagar pelo conteúdo noticioso feito por meios de comunicação social.~

Outra preocupação, de solução talvez mais difícil, tem a ver com o desinteresse, sobretudo nas camadas mais jovens, pelos órgãos e meios de comunicação social tradicionais.

E não é só no campo noticioso, mas também no do entretenimento.

Todas as preocupações elencadas, e que serão certamente apenas algumas, permitem-nos compreender a apreensão manifestada pela administração e pelos trabalhadores da RTP.

Se a RTP, enquanto concessionária do serviço público de rádio e televisão, está sujeita a responsabilidades acrescidas, deve também ser dotada dos meios necessários para as cumprir.

Um contrato deve ser um encontro de vontades, do qual deve resultar um equilíbrio dos deveres para as partes envolvidas.

Estou convicto que a nova administração, como a cessante, a par da boa gestão dos recursos, humanos e financeiros, disponíveis, saberá encontrar os meios necessários para garantir a sustentabilidade da RTP.

Como estou certo de que o Governo tudo fará para que a RTP possa cumprir cabal e integralmente os compromissos assumidos.

A RTP é uma marca de confiança, com forte implantação no mercado e um longo e prestigiado passado de serviço público; e é também a fiel depositária da memória dos acontecimentos ocorridos em Portugal e no mundo nas últimas seis décadas.

Todos estamos interessados em assegurar não só a subsistência da RTP como o futuro do serviço público de rádio e televisão.

Minhas Senhoras e Meus Senhores,

Uma palavra para o papel que cabe à Assembleia da República no acompanhamento da execução deste contrato.

A Assembleia da República deve ser mantida informada sobre o cumprimento do serviço público, designadamente através do envio anual dos Planos de Atividades e Orçamento e dos Relatórios de Atividades e Contas, podendo convocar os membros do Conselho de Administração e do Conselho Geral Independente, bem como os Provedores do Serviço Público, para a prestação de esclarecimentos respeitantes ao funcionamento do serviço público que considere necessários.

A Assembleia da República, nomeadamente através da Comissão de Cultura e Comunicação, fará, como sempre, integral e cabal uso dos poderes de acompanhamento que lhe são estipulados.

Minhas Senhoras e Meus Senhores,

A terminar, quero agradecer a vossa presença e a vossa participação.

Muito obrigado.

 

Eduardo Ferro Rodrigues

Presidente da Assembleia da República