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11.10.2021 | Sessão Plenária da 67.ª Sessão Anual da Assembleia Parlamentar da NATO | Hotel Epic Sana, Lisboa

A centralidade da NATO na defesa e ação externa de Portugal tem na realização em Lisboa da 67.ª Sessão Anual da sua Assembleia Parlamentar um ato simbólico e marcante.

É também um excelente exemplo da mais-valia das consultas políticas entre Aliados.

Lembro, aliás, a inauguração este ano, em Oeiras, da Academia de Comunicações e Informação da NATO.

Fazemos votos para que esta Sessão Anual contribua para uma Aliança Atlântica mais forte, mais coesa e resiliente no exercício das suas tarefas centrais: a defesa coletiva, a gestão de crises e a segurança cooperativa.

Portugal foi fundador da NATO – já lá vão setenta e dois anos.

Setenta e dois anos que são também de paz, de prosperidade na Europa, inconcebíveis sem a Aliança Atlântica.

Ao longo da sua existência, a NATO soube sempre adaptar-se às mudanças que foram ocorrendo no seu ambiente estratégico:

- foi assim nos tempos da guerra fria;

- foi igualmente assim na década de noventa, na gestão de crises nos conflitos armados da antiga Jugoslávia. A melhor prova do sucesso nos Balcãs está no facto de termos hoje connosco, como nossos Aliados, vários dos Estados que conquistaram então a sua independência;

- foi também o caso na resposta coletiva aos ataques terroristas de 11 de setembro. Pela primeira vez na sua História a NATO ativou o artigo V.

Hoje, o terrorismo continua a ser uma preocupação maior.

A violência cega abateu-se sobre várias cidades europeias, no Médio Oriente – e África – o Daesh praticou crimes indescritíveis de desprezo pela vida e pela dignidade humana.

O retorno ao poder dos talibãs no Afeganistão é naturalmente fator de grande preocupação.

Não há que escondê-lo.

São oportunas as palavras do Senhor Secretário-Geral sobre a conveniência de a NATO fazer um exercício de reflexão.

Convém, todavia, lembrar: a Aliança sempre esteve mandatada na base do Direito Internacional.

As notícias que nos chegam do Afeganistão são expressivas do retrocesso na vida dos seus cidadãos: execuções na praça pública; intenções de aplicação literal da sharia, incluindo amputações; discriminações sucessivas impostas às mulheres, de que o acesso à educação é o exemplo mais flagrante; regresso das discriminações contra a minoria Harara.

Não estão, de facto, a ser lançadas as bases para a estabilidade naquele País – é, por conseguinte, pertinente a afirmação clara, em agosto último, na reunião de Ministros de Negócios Estrangeiros da NATO: não serão permitidas quaisquer ameaças terroristas, que serão combatidas, com determinação, firmeza e em solidariedade.

De modo progressivo, ao longo de décadas, a Aliança Atlântica tem densificado a sua cooperação com as Nações Unidas, a União Europeia e outras organizações internacionais, como sucede com a União Africana.

Segurança cooperativa que se reflete também nas ações passadas de combate à pirataria no Índico, na operação de segurança marítima no Mediterrâneo, (Sea Guardian), no apoio à União Africana e na missão de treino no Iraque.

É bom recordar: o Sul é prioritário.

Sem paz, sem prosperidade, sem acesso à educação e ao progresso em África é a Europa que fica fragilizada.

Trabalhar pela estabilização política e económica do Sahel e da África subsaariana é do nosso interesse comum.

A parceria com a União Europeia é naturalmente a mais paradigmática.

Ela é um parceiro único e essencial da NATO.

Basta ter presente que 21 Estados- Membros da União Europeia são também Membros da NATO, e que a Suécia e a Finlândia são Enhanced Opportunities Partners.

É hoje comum a afirmação do propósito de que a Europa deve fazer mais pela sua defesa – sendo que a NATO continua a ser pedra angular na nossa defesa.

Criar sinergias, velar pela coerência, complementaridade e interoperabilidade são requisitos indispensáveis.

São da maior pertinência os objetivos constantes da Declaração Conjunta NATO-UE de 2018.

Os laços entre as duas margens do Atlântico Norte vão aliás mais além – e têm campo para ir mais além.

Um bom exemplo foi a realização, há poucos dias, em Pittsburgh, do primeiro Conselho de Comércio e Tecnológico entre os EUA e a União Europeia.

Os seus objetivos são pertinentes:  coordenar abordagens nas questões cruciais tecnológicas, nas relações económicas, na base dos princípios democráticos por nós partilhados, sem prejuízo naturalmente da autonomia regulatória própria a cada uma das partes.

O que nos une é superior às especificidades próprias de cada um.

É este o caminho a seguir.

Vivemos um tempo novo – um tempo inquietante, de simultaneidade estratégica e de ameaças interconectadas, de multipolaridade geopolítica.

Valores que são universais, de respeito pelos direitos humanos e pela dignidade humana, são secundarizados ou pura e simplesmente desprezados e suprimidos, incluindo em violação do Direito Internacional.

Somos confrontados com a descaracterização democrática, tornada por vezes numa farsa por regimes autoritários e, até, com a rejeição da democracia como princípio, em detrimento de modelos autoritários de governação em que a liberdade individual não tem lugar.

Este é um motivo acrescido para que reforcemos a coesão e resiliência aliada.

Nunca a expressão "mundo livre" fez tanto sentido.

Cabe-nos defender a democracia, os valores democráticos e as suas Instituições.

Cabe-nos trabalhar no plano internacional para que standards que são técnicos não sejam desvirtuados por considerações totalitárias, com repercussão negativa ulterior na nossa maneira de estar e de agir enquanto cidadãos.

O relatório do Grupo de Reflexão NATO 2030, Unidos para uma Nova Era, e a Agenda 2030 aprovada na Cimeira de junho abrem novos horizontes para os desafios que temos pela frente.

É natural, é até uma exigência, que se reveja o atual Conceito Estratégico, adotado em Lisboa em 2010, há mais de uma década, e que o mesmo seja endossado em Madrid, na Cimeira de 2022.

Muito mudou, de facto, no ambiente estratégico na última década:

- lembro o impacto da crise económica e financeira do início da década, que atingiu duramente Portugal;

- a deterioração do relacionamento com a Rússia desde 2014;

- o recurso às guerras híbridas;

- o crescimento das ameaças assimétricas, híbridas e do âmbito da cibersegurança. As formas e os meios empregues são vários, mas visam enfraquecer as nossas instituições políticas e trazem riscos para as nossas infraestruturas críticas, conforme se pôde verificar durante a pandemia, com os ataques levados a cabo por grupos não estatais;

- O surgimento da China como desafio sistémico, assertiva e com um entendimento diferente da essência do multilateralismo, tal como o conhecemos;

- A importância crescente da região do Índico-Pacífico é hoje uma evidência: na defesa da liberdade de navegação, na expansão da presença militar (sobretudo aérea e marítima), na pendência de diferendos sobre soberania, onde o critério que deve prevalecer é o do respeito pelo Direito Internacional e não o do facto consumado;

- A inclusão que foi feita da cibernética e do espaço como domínios operacionais, a par da terra, mar e ar – e é bem elucidativa das razões pelas quais um ataque cibernético pode ser matéria do artigo V;

- o impacto já hoje expressivo das tecnologias disruptivas emergentes, que vêm transformar a arte militar e que por vezes levantam questões éticas. Assim sucede, por exemplo, com a Inteligência Artificial, ou, ainda, com as tecnologias quântica, supersónica, ou as biotecnologias.

- a erosão da arquitetura do controlo de armamentos;

A estes desafios somam-se outros, de natureza transnacional.

Pensemos nos problemas de segurança resultantes das alterações climáticas.

Pensemos igualmente na segurança energética e a segurança alimentar.

Combater estes desafios passa em muito por trabalharmos no sentido da realização dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas.

Vivemos num mundo onde cresce a dispersão, a fragmentação, os confrontos, a concorrência e os conflitos – mas é também um mundo de interdependências.

Mais que nunca, faz sentido a nossa unidade e determinação – de europeus, americanos e canadianos.

A nossa unidade é um bem imensurável.

Não apenas para os Estados e Povos que integram a Aliança, como também, em termos mais vastos, pelo seu efeito de repercussão, na paz no mundo.

Somos uma Aliança defensiva, que trabalha pela paz e liberdade dos nossos cidadãos, no respeito, como bem o estatui o seu artigo VII, pelos direitos e obrigações que nos competem como membros das Nações Unidas.

Mais que tudo, partilhamos princípios, valores e uma herança histórica comum.

Muito obrigado pela vossa atenção.


Eduardo Ferro Rodrigues

Presidente da Assembleia da República