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​25.04.2021 | Sessão Solene Comemorativa do 47.º Aniversário do 25 de Abril de 1974 | Sala das Sessões, Palácio de São Bento

Portuguesas e Portugueses, 

Um ano depois, e no rescaldo de uma severa terceira vaga, cujo combate veio determinar o confinamento generalizado do País, com as consequências sociais e económicas que todos conhecemos, mas agora com o horizonte de redobrada esperança que as diferentes vacinas vieram trazer, a Assembleia da República volta a reunir-se em Sessão Solene para assinalar mais um aniversário do 25 de Abril de 1974. 

Foi um ano de combate, em que os profissionais de saúde e todos os que permitiram que o País não parasse merecem reconhecimento nacional. Foi um ano com muitas vítimas, até ontem 16.957, que homenageámos nesta Assembleia da República há três dias. 

Estamos pela segunda vez com um reduzido número de Deputados nesta Sala das Sessões – muitos acompanham-nos a partir dos seus Gabinetes, em linha com o que tem sucedido nos últimos meses nas Sessões Plenárias do Parlamento – e um diminuto leque de convidados, representativo das principais instituições do Estado Português e da sociedade portuguesa, cuja presença saúdo vivamente.

E, claro está, com a honrosa presença de Sua Excelência o Presidente da República, 47 dias depois de tomar solenemente posse perante a Assembleia da República, iniciando, assim, o seu segundo mandato. 

Senhor Presidente da República, 

Minhas Senhores e Meus Senhores, 

Quarenta e sete é também o número de anos que levamos de Liberdade e de Democracia. 

Um período bastante curto, quando comparado com os quase 900 anos de história que levamos de Nação, mas, ainda assim, suficiente para nele se terem alcançado significativos avanços e progressos no domínio dos direitos fundamentais e das liberdades individuais, nos domínios social e económico e, não menos relevante, no plano político. 

Quando olhamos para a infraestruturação que foi feita nas últimas décadas (na habitação social, na eletrificação, no abastecimento de água e no saneamento, na rodovia, na modernização de várias áreas da Administração Pública), quando recordamos a criação do Serviço Nacional de Saúde e da Segurança Social, quando nos detemos na evolução do parque escolar (do pré-escolar ao ensino superior), quando vemos a evolução que se deu na qualificação das pessoas, das empresas e dos territórios, ou quando olhamos para as conquistas da ciência portuguesa, concluímos serem marcantes as realizações da Democracia. 

Ainda há muito por fazer, mas muito de substancial foi conseguido. 

Há objetivos sempre insatisfatoriamente cumpridos, como os de melhor justiça, mais igualdade de oportunidades e forte solidariedade social. 

Menos de meio século que transformou Portugal, que nos trouxe ao País que somos, ao Portugal Democrático e Aberto ao Mundo. 

Um País que exerce hoje a Presidência do Conselho da União Europeia em período de ameaças à saúde e à paz no nosso Continente. 

Exerce essa responsabilidade com reconhecimento e prestígio. 

Assim como quero, neste dia, evocar todas e todos quantos, oriundos de projetos ideológicos tão distantes e quase incompatíveis, souberam convergir no essencial, elaborando e aprovando o ambicioso programa social, económico e político que foi a Constituição da República Portuguesa de 1976, cuja entrada em vigor aconteceu neste dia, há precisamente 45 anos. 

Uma Constituição que possibilitou uma grande multiplicidade de soluções de governo e, mais que tudo, uma Constituição que garantiu estabilidade política. 

É essa a prova do tempo, a que a Constituição tem sabido resistir. 

É essa lição, plena de atualidade, e a experiência histórica da Assembleia Constituinte que hoje, num quadro de pandemia, quero e devo recordar, afirmando a importância de todos sermos parte da solução. 

Representando a diversidade e a pluralidade da sociedade portuguesa, é nossa obrigação honrar o legado dos Constituintes, e das treze Legislaturas que se seguiram, ultrapassando bloqueios e traduzindo em lei as soluções para os problemas do País, e para os muitos, e cada vez mais exigentes, desafios com que nos deparamos e que teremos ainda pela frente. 

Só assim seremos capazes de aprofundar a nossa Democracia. 

Nestes 47 anos, Portugal soube transformar-se numa Democracia consolidada, num regime estável no desenho institucional que a Constituição de 1976 veio consagrar. 

Nestes 47 anos, alcançámos um Estado Social robusto e importantes níveis de progresso social e económico. 

Em 47 anos, enfrentámos sucessivas crises financeiras e orçamentais, crises institucionais, crises migratórias, a crise climática que levará décadas a superar ou a crise pandémica que ainda atravessamos – e em todas, a Democracia foi fundamental para as enfrentar e superar. 

O tanto que lográmos alcançar. 

O que há 47 anos certamente se esperava é que, hoje, perante todas as ameaças que pairam sobre as nossas vidas e sobre a nossa vida em sociedade, os representantes democraticamente eleitos das Portuguesas e dos Portugueses na Assembleia da República pudessem novamente convergir no que é estritamente essencial. 

Debatendo, no Parlamento, respostas e soluções concretas aos problemas e às necessidades concretas do País, honrando a Democracia representativa que somos, que sempre soube superar as crises enormes por que passou, nos limites da Constituição e à luz das regras do Estado de Direito. 

A experiência de 47 anos de Democracia representativa diz-nos que não há nenhuma crise que seja insuperável pelo Parlamento e pelo nosso sistema político. 

E confirma-nos também que não há Democracia sem Parlamento, e que não há Parlamento sem Partidos. Democracias robustas têm Parlamentos fortes e Partidos que conseguem representar e sintetizar os múltiplos interesses da sociedade, num equilíbrio de vontades, nomeadamente entre a da maioria e o respeito pelas minorias. É também nisto que reside a força da Democracia. 

Outro ensinamento que retiramos destes 47 anos é, também, o de que Portugal seria hoje bem diferente sem o contributo das autarquias locais para a concretização de Abril e da Democracia, a elas se devendo também muito do desenvolvimento que o País conheceu nas últimas décadas. 

E foram mais de um 1 milhão as Portuguesas e os Portugueses que se ocuparam da coisa pública, nas Assembleias de Freguesia, nas Juntas de Freguesias, nas Câmaras e nas Assembleias Municipais, e, mais recentemente, nas Entidades Intermunicipais. 

De forma abnegada, em muitos casos de forma voluntária, batendo-se pela satisfação das necessidades das suas populações, dos seus territórios, dos seus costumes e tradições. 

No ano em que se termina um ciclo autárquico, e em que outro se inicia, quero aqui deixar uma palavra de apreço para todos os Autarcas do País, que ajudam a construir os consensos necessários ao progresso de todos quantos representam. 

Senhor Presidente da República, 

Minhas Senhoras e Meus Senhores, 

Foi há 47 anos que, naquela madrugada extraordinária, Portugal saiu da sombra de 48 anos de opressão. 

A Revolução de Abril trouxe-nos inúmeras conquistas, e pese embora ter posto fim ao analfabetismo brutificante a que, até então, se assistia, não logrou ainda erradicar, em Portugal, as ideias e os valores que caracterizaram aquele período negro da nossa história, muitos deles adormecidos desde então. 

Uma das grandes virtudes da Democracia e da Liberdade é a de permitir a convivência entre todos os credos políticos, incluindo os antidemocratas. 

Nas redes sociais, os promotores de falsas notícias, de ódio, de desinformação, de calúnias, de mentiras, contam-se por muitas centenas, e atingem milhões de alvos. 

As caixas de comentários de alguns órgãos, ditos de comunicação social, são um esgoto a céu aberto. 

Esta não é uma realidade apenas nacional. Muito pelo contrário. 

Basta olhar para o que se passa por essa Europa fora – até mesmo em países tão próximos, como Espanha, França ou Itália – para perceber que este movimento vai fazendo o seu caminho, e, aos poucos, enfraquencend0 a Democracia, o Estado de Direito e a convicção por valores fundamentais que são os nossos. 

Veja-se, também, o que sucedeu nos Estados Unidos da América, com o inconcebível episódio da invasão do Capitólio, sede do Congresso, apoiada – ou, pelo menos, tolerada – ao mais alto nível. 

Onde, na Europa e no Mundo, pareciam florescer democracias, estas são ameaçadas, num retrocesso histórico que nos reaproxima da realidade sombria de um passado onde ninguém deveria querer voltar. 

São sinais de regressão, como os identifica o Papa Francisco, que nos alerta para novas formas de egoísmo e de perda do sentido social, mascaradas por uma suposta defesa dos interesses nacionais. 

Não é fácil combater o discurso simplista dos antidemocratas. 

Não é fácil combater a desinformação, a mentira, o medo. 

Mas sei, no entanto, que a Democracia de Abril é suficientemente resiliente para resistir a esta investida, e robusta o suficiente para a combater. 

Nesta batalha, que é a batalha pela nossa sobrevivência enquanto sociedade aberta, tolerante e inclusiva, cabe-nos a nós, democratas, um papel fundamental.

Um combate em que todos somos poucos. 

Um combate em que os Partidos Democráticos são fundamentais. São eles parte da muralha que nos deve defender dos avanços da intolerância, da xenofobia, do ódio. 

Um combate em que o fortalecimento do Estado de Direito e a responsabilização de todos os protagonistas são absolutamente essenciais. 

Um combate em que é fundamental uma comunicação social livre, isenta e credível, capaz de informar factos, com verdade. 

Onde a liberdade de expressão não se pode confundir com a expressão sem regras, a qual, fazendo mão do anonimato, mais não ambiciona que o insulto, a ofensa e a injúria. 

Onde o combate contra o chamado politicamente correto muitas vezes esconde o saudosismo pelos tempos de impunidade da violência doméstica, da supremacia racial, da homofobia, do desprezo pela dignidade e pela individualidade dos outros. 

Senhor Presidente da República, 

Minhas Senhoras e Meus Senhores, 

Nesta Sessão Solene, não poderia igualmente deixar de recordar as guerras coloniais que se iniciaram em 1961, há 60 anos, e a que a Revolução de Abril veio pôr um fim. 

Fazê-lo hoje é um imperativo – político, moral e de consciência. 

Recordando que, no longo período de 13 anos de guerras, se perderam milhares de vidas, de portugueses e africanos, a par de um rasto de destruição sem paralelo (mesmo das sociedades), ainda hoje bem visível. 

Há, no entanto, uma outra faceta destes longos anos: a do tempo perdido. 

De oportunidade desperdiçada. 

Treze longos anos que poderiam ter sido de ganhos em termos políticos, sociais e económicos, tivessem eles sido de abertura democrática do regime e de negociação política. 

Treze longos anos que poderiam ter mudado o rumo da nossa história e da história dos Países Irmãos se a sua independência tivesse chegado mais cedo, e, com ela, o direito à sua autodeterminação. Direito à Liberdade.

Foram anos devastadores para todos nós.

Uma devastação que poderia ter sido evitada, diz-nos a história. 

A recordação do ano de 1961 está aí para o provar.

E, 7 anos mais tarde, o ano de 1968 voltou a ser uma oportunidade perdida. 

Sessenta anos volvidos, há ainda marcas bem presentes deste passado, como sejam os discursos xenófobo e racista em algumas franjas da sociedade ou algumas representações sociais do período colonial – sinal de feridas abertas, ou, melhor, de feridas ainda não completamente saradas. 

Não podemos ignorar estes sinais. 

Ao Parlamento cabe um papel da maior relevância no longo caminho que há ainda a percorrer, revisitando este período à luz dos valores democráticos, discutindo a memória do colonialismo e, 47 anos depois, refletindo sobre a presença colonial em África. 

Senhor Presidente da República, 

Minhas Senhoras e Meus Senhores, 

Pela Democracia, a Assembleia da República assume um papel insubstituível, até mesmo pela centralidade que detém no sistema político português, visto ser aqui, e só aqui, que está representada a pluralidade de vontades de todas as Portuguesas e de todos os Portugueses. 

É na Assembleia da República que são aprovadas as leis estruturantes para o País. 

É aqui que, de forma transparente, a ação do Governo é diariamente fiscalizada e escrutinada. 

É aqui que têm palco os principais debates políticos nacionais. 

Tudo o que acabo de referir remete-nos para o cumprimento dos deveres constitucionais da Assembleia da República.

Mas de um Parlamento moderno como o nosso espera-se mais. Exige-se mais. 

Exige-se um maior envolvimento com os cidadãos, uma progressiva aproximação aos cidadãos. 

Aproximação de eleitos e eleitores, no duplo sentido. 

É preciso que todos tenham consciência disso, começando por todos nós, que servimos as Portuguesas e os Portugueses nesta Assembleia. 

O trabalho e o exemplo ao ser, de longe, no conjunto das instituições, a mais transparente, mais escrutinada, mais escrutinável. 

Devemos ter orgulho em sermos Deputados, em servirmos a República, a Democracia e Portugal. 

Mais faremos, no futuro próximo, cientes da necessidade de inverter a tendência de distanciamento entre os cidadãos e as instituições, e sensíveis ao pulsar da sociedade, sobretudo dos mais novos, cujas primeiras preocupações estão hoje na forma como cuidamos do planeta. 

Refiro-me à Casa do Parlamento Centro Interpretativo da Assembleia da República, cuja abertura, depois de um atribulado processo administrativo, se espera para breve, ainda no decurso da presente Legislatura, e, nessa medida, antes mesmo de celebrarmos os 50 anos da Constituição. 

Refiro-me ao Programa Parlamento dos Jovens, nascido em 1995 por impulso dos Antigos Presidentes Barbosa de Melo e Almeida Santos com o propósito de estimular o gosto pela participação cívica e política e, sobretudo, promover o respeito pelo debate democrático e pela diversidade de opiniões, que envolveu, na edição transata, mais de 1.000 escolas. 

Um número record que atesta a relevância deste verdadeiro programa de aprendizagem da Democracia e que nos convoca para a importância do debate político, fundamental para aproximar os mais novos da participação pública.

Para a coisa e para a causa pública. 

Atestando a importância de o debate político ser feito além das juventudes partidárias. Em casa, nas escolas – como temos exemplos motivadores no Norte da Europa. 

Tudo isto comporta desafios para o Parlamento, bem sei, mas são desafios em que o Parlamento sairá mais forte, mais sólido e mais robusto. 

Desafios, aliás, que a Assembleia da República tem sabido ultrapassar desde o seu nascimento, num processo de consolidação contínua, bem-sucedido. 

Primeiro, o desafio do compromisso, construindo os consensos necessários a assegurar o apoio a governos e a políticas que permitam o desenvolvimento do País.  

Sobretudo, em tempos de graves crises.

Segundo, o desafio legislativo, erigindo o edifício democrático e as leis estruturantes da Democracia.

Neste particular, devo referir-me à legislação que nos permitiu afirmar o Estado de Direito que somos, um trabalho nunca esgotado, que carece de aperfeiçoamento e melhoria diários.

Os titulares de cargos públicos e políticos têm de participar e decidir para aperfeiçoar a legislação sobre eles próprios, tendo como base as alterações concretizadas em 2019.

Mas, atenção: não há donos da transparência, nem é aceitável nenhuma lógica que ponha os eleitos, os magistrados judiciais, os procuradores, como suspeitos à partida.

Terceiro, o da fiscalização, acompanhando a evolução verificada nos Parlamentos das Democracias mais antigas, criando instrumentos para um controlo eficaz do Governo, valorizando, em particular, o papel das oposições. 

Por último, o já referido desafio de abertura à sociedade.

E é neste ponto que a Assembleia da República é convocada a celebrar acontecimentos ou personalidades que nos ajudam a compreender melhor o País que somos e que queremos ser.

É, por exemplo, neste contexto que o Parlamento assumiu, já nesta legislatura, o compromisso de homenagear e perpetuar a memória de figuras ímpares da nossa história, como é o caso de Aristides de Sousa Mendes ou de Eça de Queiroz, com vista a conceder-lhes Honras de Panteão Nacional.

É igualmente neste contexto que o Parlamento tem, desde há vários meses, vindo a comemorar o Bicentenário do Constitucionalismo Português e da Revolução Liberal que está na sua origem, e onde podemos encontrar, também, as origens do nosso sistema político.

É, pois, também por isso que estamos hoje, aqui, reunidos a celebrar o 25 de Abril.

Celebrando o passado, mas com olhos no futuro. Esperando que as gerações mais novas possam encontrar nestes exemplos, e no 25 de Abril em particular, a inspiração para o que podem ser.

Assumindo que a Liberdade de que todos disfrutam tem de ser diariamente defendida com o vigor necessário.

Para que se envolvam com a causa pública, com a comunidade, ajudando a tornar este País melhor e melhor todos os dias.

Um País mais justo, mais livre e mais democrático.

Para o qual contribuíram tantos heróis discretos, civis e militares, muitos anónimos, que, antes de Abril, lutaram, das mais diversas formas, contra a Ditadura, ajudando a fazer cair o regime do Estado Novo.

As gerações que fizeram o 25 de Abril e edificaram a Constituição estão, naturalmente, a desaparecer. Tenhamos confiança de que os mais jovens saberão defender os valores essenciais da Liberdade, da igualdade de oportunidades e da solidariedade social.

É esse País e essa Democracia que celebramos hoje com a mesma convicção e determinação com que, há 47 anos, com ela sonharam os Capitães de Abril, aqui representados pela Associação 25 de Abril, a quem endereço uma saudação muito, mas muito especial.

Pais de uma Revolução que não tem proprietários, porque aos que participaram na libertação do País se seguiram várias gerações que ajudaram a construir o Portugal Democrático em que vivemos.

Uma Revolução que tem autores: o Movimento das Forças Armadas e os milhares de portugueses que se bateram contra a Ditadura e a guerra durante longos anos.

Muito obrigado.

Viva o 25 de Abril! 25 de Abril sempre!

Viva Portugal!