18.02.2020 | Cerimónia de Posse do Presidente e Membros da Comissão Nacional de Eleições | Sala de Visitas da Presidência, Palácio de São Bento
As eleições são o ato mais nobre e solene em Democracia: o momento em que o povo elege os seus representantes, através de sufrágio universal, igual, direto e secreto.
Nos termos da Constituição, cabe ao Estado a tarefa fundamental de assegurar a transparência e autenticidade dos atos eleitorais, de modo a garantir que estes ocorram em liberdade, sem perturbações e sem interferências.
Para concretização desta incumbência, foi criada a Comissão Nacional de Eleições, entidade administrativa independente, tendo como atribuições genéricas:
- Promover o esclarecimento objetivo dos cidadãos acerca dos atos eleitorais e referendários, designadamente através dos meios de comunicação social;
- Assegurar a igualdade de tratamento dos cidadãos em todos os atos de recenseamento e operações eleitorais/referendárias;
- E assegurar a igualdade de oportunidades de ação e propaganda das candidaturas a determinada eleição e dos intervenientes nas campanhas para os referendos.
Ao dar hoje posse ao Presidente e demais membros da Comissão Nacional de Eleições estou ciente que a missão que os espera não é fácil.
O nível de desinformação a que hoje assistimos constitui uma verdadeira ameaça para a democracia.
Preocupa-me, neste particular, o impacto da desinformação em atos eleitorais ou de consulta popular.
Preocupam-me as ações de desinformação que possam (i) interferir no regular funcionamento das instituições democráticas, (ii) influenciar os resultados das consultas aos cidadãos, e (iii) desacreditar os valores fundamentais do Estado de direito democrático.
Os meios agora ao dispor de cada um – i.e., internet, plataformas e redes sociais – permitem uma sofisticação e uma amplitude sem paralelo na disseminação da desinformação.
No seu relatório Freedom on the Net 2019, a organização Freedom House constata que se verificaram ingerências através de meios digitais em 26 dos 30 Estados que realizaram eleições ou referendos entre junho de 2018 e maio de 2019.
E esta interferência ocorreu mesmo em democracias que tínhamos como sólidas, de fortes tradições democráticas, inclusive no seio da União Europeia.
Minhas Senhoras e Meus Senhores,
Outra matéria que não pode deixar de nos preocupar é a abstenção.
Em Portugal, tal como em muitas democracias consolidadas, alguma desafeição política tem-se traduzido num aumento da abstenção eleitoral. Contudo, esta não é uma tendência inexorável, nem nos podemos conformar com ela.
Nas últimas eleições legislativas, registou-se um valor recorde em Portugal neste tipo de eleições, com cerca de 50% de abstenção.
É seguro dizer que este preocupante número se encontra inflacionado, reflexo do desfasamento entre a chamada abstenção real e técnica.
Importa, por isso, contextualizar esta informação, mas também saber o que é possível fazer para corrigir esta dessintonia e termos cadernos eleitorais mais fiáveis.
No entanto, embora aquele valor não corresponda à abstenção real (que andará porventura mais perto do um terço do eleitorado residente no País), a tendência de aumento da abstenção continua, infelizmente, a verificar-se.
Entre os desafios que não deixarão de interpelar a Comissão Nacional de Eleições estará o que se pode fazer para combater a abstenção.
Este combate, que é um combate por mais democracia, tem certamente diversas frentes, que convocam desde o poder político a instituições como a CNE, passando também (estou em crer) pelas nossas escolas, por exemplo.
Com efeito, acredito que a formação cívica, sobretudo em idade escolar, constitui uma das vias mais sólidas para garantirmos uma cultura política propícia à participação política informada.
A CNE tem mostrado estar sensível a esta dimensão, nomeadamente através da divulgação de material informativo e pedagógico relevante sobre eleições, organização e participação eleitoral.
Mas importa continuar a explorar outras vias que possam contribuir para este objetivo de combate democrático à abstenção.
Politicamente, preocupa-me sobretudo notar as desigualdades socioeconómicas que a abstenção também reflete.
Desigualdade económica, porque, desde há cerca de duas décadas para cá, a abstenção parece afetar crescentemente os mais pobres (em contraste com o que se passa com os mais ricos).
E desigualdade geracional, com os jovens a participarem menos, situação que começa a afetar também a faixa dos cidadãos entre os 30 e os 45 anos.
Importa fazer o que estiver ao nosso alcance para ajudar a inverter esta situação.
Minhas Senhoras e Meus Senhores,
A complexidade desta missão determina que os membros da Comissão Nacional de Eleições tenham reconhecido mérito e sejam possuidores de qualificações e atributos indispensáveis às funções a desempenhar.
A formação e a experiência profissional dos designados – alguns são, aliás, reconduzidos nos cargos – são bom testemunho de que satisfazem plenamente os requisitos exigidos.
Antes de terminar, quero deixar uma palavra de apreço e agradecimento aos que agora cessam funções pelo inestimável serviço prestado.
A todos, desejo os maiores sucessos.
Muito obrigado.
Eduardo Ferro Rodrigues
Presidente da Assembleia da República