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09.03.2021 | Sessão Solene de Tomada de Posse do Presidente da República | Sala das Sessões, Palácio de São Bento


A Assembleia da República reúne-se hoje, dia 9 de março, em Sessão Solene, para testemunhar a tomada de posse do Presidente da República, em cumprimento do disposto na Constituição.

Este é, sem dúvida, um dos atos mais importantes da nossa Democracia, tendo como intervenientes, num exemplo perfeito de interdependência, os dois órgãos de soberania que colhem a sua legitimidade no sufrágio universal e direto.

É o momento em que o Presidente da República Eleito se apresenta na Casa da Democracia e, perante esta, toma posse e presta declaração de compromisso, em adesão à Constituição e aos ideais e princípios aí consagrados, assim dando início ao seu mandato.

É uma cerimónia que deve ser tão pública quanto possível, permitindo ao povo, no qual reside a soberania, participar na investidura do seu mais alto magistrado.

A situação pandémica que se vive não admite, infelizmente, que esta cerimónia tenha a dimensão que lhe é devida, como nas anteriores ocasiões, em que, a par do pleno dos 230 titulares deste órgão de soberania e das mais altas individualidades do Estado Português, bem como dos representantes do Corpo Diplomático acreditado no nosso País, os demais cidadãos fazem questão de comparecer, enchendo as Galerias desta Sala das Sessões.

O formato restrito da cerimónia não lhe retira, contudo, solenidade, significado ou audiência atenta.

É com emoção que a Assembleia da República se reúne hoje com o Presidente da República sob a força da Constituição.

Excelência,

Minhas Senhoras e meus Senhores,

A eleição para o Presidente da República e a campanha que a antecedeu realizaram-se este ano num quadro de pandemia e sujeitas às múltiplas restrições decorrentes do estado de emergência que ainda vivemos, que nos impõe, a todos, um dever cívico de recolhimento e cuidados acrescidos.

Não obstante, apresentaram-se a sufrágio vários candidatos, patenteando a maior diversidade ideológica em ato semelhante, até à data, e que aqui saúdo.

A Vossa Excelência dirijo, a título pessoal e em nome da Assembleia da República, uma saudação especial pela forma clara e expressiva da sua eleição: à primeira volta e com um significativo acréscimo de votos face ao resultado de 2016.

Foi um ato que ocorreu na data designada, sem percalços e sem efeito assinalado na propagação do coronavírus, contrariando os receios mais alarmistas e confirmando a desnecessidade do recurso a expedientes circunstanciais, que seriam verdadeiras entorses à Democracia.

É, sobretudo, em contextos de crise ou em circunstâncias extraordinárias – como aquelas que enfrentamos – que temos de ser intransigentes na defesa da democracia e exigentes no cumprimento das suas regras e no respeito pelos direitos fundamentais que a nossa Constituição consagra.

Uma palavra de reconhecimento é aqui também devida às Portuguesas e aos Portugueses que exerceram o seu direito de voto, bem como a todos os que tornaram possível este ato eleitoral.

Foi uma lição de cidadania que engrandeceu a Democracia portuguesa.

Excelência,

Minhas Senhoras e meus Senhores,

Os cinco anos de mandato de Vossa Excelência foram repletos de momentos marcantes.

Com a reposição de direitos e garantias que haviam sido retirados na sequência da intervenção da troika, e com o esvaziamento da tensão social e até institucional que existia, Portugal entrou numa trajetória positiva, superando com êxito a grave crise económica e financeira que até então se vivia e conseguindo mesmo o primeiro excedente orçamental em Democracia.

Também em termos internacionais, foram assinaláveis os sucessos alcançados, nas frentes diplomática, cultural e desportiva.

Neste particular, não poderia deixar de recordar a eleição de António Guterres como Secretário-Geral das Nações Unidas, eleição que se deveu às muitas e diversificadas qualidades do candidato, mas, igualmente, do prestígio de que beneficiamos, enquanto Povo e enquanto Nação de matriz universal.

Portugal recuperou prestígio, tornou-se uma referência e um destino preferencial.

E nós retomámos o orgulho de sermos Portugueses.

A estes sucessos não foi alheio o prestimoso contributo de Vossa Excelência.

Durante estes anos, realizaram-se, em normalidade democrática, eleições legislativas, regionais e autárquicas, bem como europeias, tendo, em alguns casos, resultado reconfigurações do panorama político, com o surgimento de novas forças políticas.

A Democracia tornou-se mais diversa e inclusiva, com uma representatividade acrescida, reveladora de um Portugal com um pleno sentido da liberdade, sem restrições ou mordaças.

Infelizmente, verificaram-se também alguns acontecimentos particularmente dramáticos, que testaram as nossas capacidades políticas e mesmo éticas, como foram: 

• os incêndios devastadores de 2017, que ceifaram mais de 100 vidas e destruíram casas, empresas, empregos, com repercussões que ainda hoje se fazem sentir; ou

• a pandemia de COVID-19, que, desde há mais de um ano, afeta, de forma persistente e impiedosa, toda a população e
todos os setores de atividade, com um forte impacto social, económico e financeiro e, sobretudo, com um custo irreparável em vidas humanas, que ontem ascendia a 16.565.

A estas catástrofes foi, porém, possível evitar somar uma crise política, a qual teria sérias consequências, não só a nível interno, mas também ao nível da imagem externa de Portugal.

O papel moderador que Vossa Excelência desempenhou em ambas as situações – sob grande pressão, sublinhe-se – foi crucial para garantir estabilidade política e assegurar o regular funcionamento das instituições.

Duas preocupações permanentes que muito o honram e nos honram.

Excelência,

Minhas Senhoras e meus Senhores,

O combate à pandemia é, no curto prazo, a nossa prioridade, como Vossa Excelência fez questão de frisar na intervenção que proferiu na noite da sua reeleição.

Vencer a pandemia é imprescindível para restituir normalidade à vida familiar e social, devolver as crianças e os jovens à escola, retomar a atividade económica, recuperar os empregos e superar a crise económica e social – e cultural, porque sem cultura não sobreviveríamos.

O conhecimento entretanto adquirido e a esperança que a vacina veio trazer dão-nos um novo alento e permitem antever, num futuro não muito longínquo, se não a erradicação do vírus, pelo menos um fim de muitas das restrições que atualmente vivemos.

Este é um objetivo que só se alcança num esforço conjunto, enquanto comunidade.

Quero aqui sublinhar o contributo da Assembleia da República nesta luta, quer autorizando as sucessivas declarações de Estado de Emergência – em resposta aos pedidos de Vossa Excelência –, quer fiscalizando as medidas tomadas pelo Governo para evitar as consequências da pandemia e propondo medidas adicionais ou alternativas.

E não obstante as normais, e até mesmo desejáveis, divergências e as políticas alternativas preconizadas, há um reconhecimento pela larga maioria dos agentes políticos do que é essencial e da responsabilidade histórica que sobre nós impende.

Estou, pois, convicto de que os Deputados, enquanto titulares deste órgão de soberania, mas também como protagonistas de um serviço essencial do Estado, saberão, tal como até aqui, estar à altura das suas obrigações e do contributo que lhes é exigido.

Debelada a pandemia, é imperioso assumir a reparação sustentada dos danos causados por esta crise – na saúde, na economia, na cultura, na educação, na sociedade – e a eliminação das debilidades estruturais que persistem e limitam o potencial de desenvolvimento do País – que a pandemia tornou ainda mais evidentes.

Para alcançar esse objetivo, têm vindo a ser apresentados e aprovados, após discussão pública, os instrumentos e os projetos estruturantes entendidos como fundamentais.

Por vezes surgem acusações de que não se discutem os assuntos, as propostas ou os projetos, mas talvez mais relevante seja a ausência de consequências prática dos debates.

Um bom exemplo disso é a discussão sobre a localização do novo aeroporto de Lisboa, que leva já 52 anos, e que, a cada ano que passa, se torna mais difícil.

Há um momento em que é necessário dar a discussão por concluída e decidir. É isso que esperam de nós; para isso fomos eleitos: para tomar decisões e para resolver os problemas que afetam o País.

A avaliação, essa, far-se-á nas urnas.

O que temos de assegurar, e aqui a Assembleia da República terá um papel essencial, é garantir a boa utilização dos dinheiros públicos e dos fundos europeus, que a recuperação prevista não deixe ninguém para trás, que sejam asseguradas mais oportunidades de ascensão social, sem a qual não há desenvolvimento.

Neste desafio, Portugal conta com a solidariedade e o contributo da União Europeia, que tem tido um papel fundamental na articulação e na mobilização dos meios necessários para uma resposta europeia comum ao surto de coronavírus, não só na saúde pública, mas também na redução do impacto socioeconómico devastador desta pandemia.

Como País europeu, temos agido de forma concertada e com iniciativa política.

Excelência,

Minhas Senhoras e meus Senhores,

Hoje, quando Portugal assegura novamente a Presidência do Conselho da União Europeia, quero agradecer a todas as Senhoras Deputadas e a todos os Senhores Deputados que nas Comissões Permanentes têm velado pelo respeito pelos direitos consagrados no Tratado de Lisboa aos Parlamentos Nacionais, e que tanto se têm empenhado, em condições tão adversas, em assegurar a realização das ações que nos propusemos efetuar durante o Semestre em curso.

Nestes dois meses de Dimensão Parlamentar da Presidência Portuguesa, a Assembleia da República recebeu a visita do Colégio de Comissários e levou a cabo várias iniciativas de que singularizo, pelo seu alcance, duas conferências interparlamentares:

- sobre a estabilidade e governação económica, organizada com o Parlamento Europeu e o seu Presidente; e

- sobre a Política Externa e de Segurança Comum e a Política Comum de Segurança e Defesa.

Com temáticas diferentes, as duas conferências tiveram um propósito comum: pensar estrategicamente a Europa.

Como bem declara o Tratado de Lisboa, os Parlamentos Nacionais contribuem ativamente para o bom funcionamento da União.

A cooperação internacional sempre fez parte integrante da nossa matriz democrática e da nossa política externa. Neste caso, ela é ainda mais fundamental.

Nenhum país sozinho pode vencer ou superar as consequências da pandemia.

Como lembrou o Papa Francisco, perante um desafio que não conhece fronteiras, não se podem erguer barreiras.

Os muros do nacionalismo e do populismo são impotentes para travar a pandemia.

E como não ter presente o apelo e a advertência feitos por António Guterres, reiterados há duas semanas perante os nossos Deputados numa conferência no âmbito da Dimensão Parlamentar da nossa Presidência do Conselho da União Europeia, sobre a necessidade absoluta de todos, independentemente do lugar onde habitam e das respetivas condições económicas, terem acesso à vacinação contra a COVID-19?

Estamos perante um imperativo ético de bem comum, e uma exigência de gestão pública, porquanto, como o mostram as variantes do vírus, nenhum de nós estará a salvo enquanto outros lutam pela vida em condições de miséria económica, de conflito armado ou, tão simplesmente, de falta de acesso à saúde pública. 

Não nos esqueçamos destas palavras.

Excelência,

Minhas Senhoras e meus Senhores, 

Afirmou ainda Vossa Excelência na noite de 24 de janeiro que a sua eleição é a demonstração de repúdio do extremismo por parte dos Portugueses. 

Estou certo de que assim é, sendo este um assunto que a todos deve preocupar e que exige ação e resposta determinadas.

Organizações como a Freedom House avisam-nos que a Democracia está sob ataque e que a liberdade no mundo se encontra em declínio há 15 anos consecutivos, sendo que menos de um quinto da população mundial vive em países totalmente livres.

Nesse período, assistimos ao ressurgimento de movimentos e de ideais de extrema direita, com substanciais ganhos mesmo em Estados-Membros da União Europeia de sólidas tradições democráticas.

Uma tendência que preocupa não só governos e forças de segurança de países democráticos, mas também organizações internacionais ou religiosas.

Nas palavras do Secretário-Geral das Nações Unidas, «Os movimentos de supremacia branca e neonazi são mais do que ameaças de terrorismo interno – tornam-se ameaças transnacionais que estão a crescer a cada dia. Precisamos de uma ação coordenada global para derrotar este grave e crescente perigo». 

São questionadas a universalidade dos princípios e valores em que assentam as sociedades livres e os fundamentos da ordem multilateral internacional construída ao longo de décadas. 

As raízes deste fenómeno têm terreno interno fértil na polarização política; nos populismos vários; nas desigualdades que fragilizam a coesão social; nas situações de corrupção, que há que combater com determinação e eficácia; nos ataques ao Estado de Direito; na xenofobia e no racismo que negam a igualdade, diversidade e unidade na dignidade, intrínsecas a cada ser humano. 

São eles acompanhados de outra dimensão, esta de natureza externa. 

A promoção do autoritarismo e da reivindicação da sua pretensa melhor capacidade de resposta aos problemas atuais, recorrendo à manipulação e à desinformação, potenciadas pelas novas tecnologias e pelo seu imediatismo. 

Surgindo por vezes sob a capa de nacional-populismo ou de movimentos inorgânicos, o radicalismo e o extremismo são, inquestionavelmente, perigos para a Democracia, com as dicotomias antissistema, repletas de respostas falaciosas e impraticáveis, sem adesão à realidade e com difícil relação com a verdade e os factos. 

É um fenómeno que explora, oportunista que é, os receios da população e as dificuldades que os governos democráticos têm manifestado na resposta às suas inquietações – e que perturbações como a pandemia tendem a acentuar. 

É um fenómeno que se aproveita do atual afastamento de parte da população em relação às instituições, partidos políticos, associações ou sindicatos tradicionais, que sentem muitas vezes já não os representar. 

Afastamento da própria política. 

Não podemos, por isso, afrouxar os cuidados perante sinais deste perigo. 

Pelo contrário, devemos redobrar os esforços na procura de soluções para os problemas e os anseios da população no sentido de o anular. 

Como políticos, e como cidadãos que somos, não podemos deixar que aquilo que chega a parecer uma tendência suicidária de algumas Democracias nos afete.

Todos estamos convocados para esta batalha, porque dela depende a nossa sobrevivência enquanto Povo e enquanto Estado soberano. 

Porém, não se esgotam nestes tópicos as nossas preocupações. 

Outros há que merecem a nossa melhor atenção e que, certamente, teremos a oportunidade de sobre eles agir, como sejam as alterações climáticas, a qualificação da população, a transição digital, ou a questão das migrações e asilo. 

As mudanças estruturais de Portugal são hoje uma necessidade histórica. 

Excelência, 

Minhas Senhoras e meus Senhores, 

Durante o mandato que Vossa Excelência hoje inicia, o regime fundado em 25 de Abril ultrapassará, em longevidade, o regime salazarista e celebrará o seu 50.º aniversário. 

Apraz-me, por isso, que, nessas datas marcantes, Portugal tenha na Presidência da República um defensor acérrimo da Democracia e dos seus princípios, que respeita o pluralismo e a diferença, e que nunca desiste da justiça social. 

Um Presidente que foi, que é, um Constituinte, há que recordar. 

Estou certo de que o novo mandato de Vossa Excelência se pautará, como no que acaba de terminar, pelo mais estrito e imparcial respeito pelos valores e princípios constitucionais, e que manterá com a Assembleia da República as mais cordiais relações institucionais, em total deferência pelo princípio da separação dos poderes e da interdependência, e tendo sempre presente que é aqui, no Parlamento, que se encontra representada a sociedade portuguesa, na sua diversidade e pluralidade.

Ao terminar, Senhor Presidente da República, prezado amigo, quero renovar-lhe o desejo das maiores felicidades no exercício das suas funções, com a certeza de que pode contar com a total lealdade institucional da Assembleia da República, e do seu Presidente.

Pela República.

Pela Democracia.

Por Portugal.

Eduardo Ferro Rodrigues 

Presidente da Assembleia da República