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A Independência do Brasil - Mostra Documental


Para se falar da independência do Brasil é necessário recuar à primeira década de 1800, mais concretamente a 29 de novembro de 1807, data em que a Corte de Portugal rumou para este novo destino, para aí se instalar, na sequência das invasões francesas. Levou consigo vários serviços, numa tentativa de assegurar o funcionamento das instituições e contornar o impacto da presença dos franceses em solo português. No total, foram para o Brasil cerca de 15 000 pessoas. Em Portugal permaneceram as forças inglesas que defenderam o território da ocupação das tropas napoleónicas.

O fim destas invasões não representou, porém, o fim da permanência das tropas inglesas em Portugal, passando elas a assumir um papel muito para além da defesa militar, o da tutela política. Apesar do clima de estabilidade, D. João VI não demonstrava sinais de querer regressar a Portugal, voltar a assumir o domínio do território e recolocar o nosso país como o polo centralizador das políticas e gestão do reino. Inclusivamente, em 1815, ainda enquanto príncipe regente, D. João VI elevou o Brasil à categoria de reino, deixando assim de ser uma colónia.

Este conjunto de fatores foi fazendo com que em Portugal um sentimento crescente de insatisfação ganhasse cada vez mais expressão e se começasse a pensar em formas de recuperar a soberania do país, não só o pleno controlo da sua gestão interna, através do abandono total e definitivo das tropas inglesas do território, como também a recuperação do seu papel de líder de um reino e de um domínio ultramarino. E assim, em 24 de agosto de 1820, deu-se a revolução liberal, no Porto. Esta revolução levou à criação de duas juntas, a Junta Provisional do Governo Supremo e a Junta Provisional Preparatória das Cortes. Em conjunto, estas duas juntas enviaram uma carta a D. João VI, na qual solicitavam a aprovação da convocação das Cortes e o seu regresso a Portugal. Com esta medida, Portugal deixaria de ter definitivamente a presença inglesa no seu território assim como reclamaria a si, de novo, as rédeas do reino (ou dos reinos, já que o Brasil também já tinha sido elevado a essa categoria) e suas colónias.

Parecer da Comissão de Verificação de Poderes sobre a eleição dos Deputados pela província de Pernambuco
Parecer da Comissão de Verificação de Poderes sobre a eleição dos Deputados pela província de Pernambuco. 29 de agosto de 1821.
Cota AHP: Secção I/II, cx. 8, mç. 6, doc. 87

Entre 10 e 30 de dezembro de 1820, realizaram-se em Portugal continental as eleições para os Deputados para as Cortes Constituintes. Nos territórios ultramarinos, foram realizadas mais tarde. Foram constituídas as Cortes Gerais, Extraordinárias e Constituintes, com o objetivo de criar os alicerces para uma monarquia constitucional e a elaboração da primeira lei fundamental, a Constituição de 1822. A primeira sessão realizou-se a 24 de janeiro de 1821, tendo as Cortes reunido até 4 de novembro de 1822. Após este período, os trabalhos parlamentares foram assegurados pelas Cortes Ordinárias.

Na sequência da carta enviada pela Junta Provisional do Governo Supremo e Junta Provisional Preparatória das Cortes a solicitar o seu regresso, D. João VI nomeou, em 7 de março de 1821, seu filho, D. Pedro IV, como príncipe regente do Brasil e partiu para Lisboa, em 26 de abril de 1821, a fim de assumir novamente o reinado em Portugal e, à semelhança do que acontecera em 1807, trouxe com ele muitos dos funcionários das instituições que funcionavam agora no Brasil.

Parecer da Comissão Especial dos Empregados Vindos do Brasil acerca dos empregados a quem poderá ser concedido um adiantamento de dois meses de ordenado
Parecer da Comissão Especial dos Empregados Vindos do Brasil acerca dos empregados a quem poderá ser concedido um adiantamento de dois meses de ordenado. 18 de outubro de 1821.
Cota AHP: Secção I/II, cx. 38, mç. 22, doc. 11A

As matérias trazidas a debate nas Cortes relativas ao Brasil foram diversas, como a lei da imprensa e a questão dos povos indígenas. Porém, a atividade das Cortes refletiu igualmente a profundidade da tensão política e social que se adensava cada vez mais entre Portugal e Brasil. Refira-se, a este propósito, a criação de comissões especiais para melhor analisar algumas questões[1]. Por exemplo, a Comissão Especial dos Empregados Vindos do Brasil foi criada a partir de uma proposta do Deputado Manuel Fernandes Tomás e tinha como objetivo analisar a situação particular dos funcionários das diversas instituições que estavam em processo de transição do Brasil para Portugal, por forma a ser-lhes atribuído um subsídio que garantisse a sua subsistência até regressarem às suas funções.

Parecer da Comissão Especial para Fixar as Relações Comerciais entre Portugal e o Brasil acerca da revisão das pautas das alfândegas do Brasil, no âmbito do Tratado de Comércio entre Portugal e Inglaterra
Parecer da Comissão Especial para Fixar as Relações Comerciais entre Portugal e o Brasil acerca da revisão das pautas das alfândegas do Brasil, no âmbito do Tratado de Comércio entre Portugal e Inglaterra. 7 de março de 1822.
Cota AHP: Secção I/II, cx. 83, mç. 51, doc. 45

Outra comissão criada foi a Comissão Especial para Fixar as Relações Comerciais entre Portugal e o Brasil, cujo objetivo foi o de analisar a reforma das pautas das alfândegas, nomeadamente quanto às importações britânicas.

De facto, o Brasil adquirira um estatuto diferente desde que a Corte e alguns serviços se haviam mudado para lá, nomeadamente com o fim do pacto colonial, a abertura de portos, a possibilidade da realização de trocas comerciais diretamente com países estrangeiros, como a Inglaterra, assim como a deslocação do poder judicial. O regresso a Portugal fez com que surgisse um ambiente de tensão política e social, uma vez que se entendia que a deslocação da Corte novamente para o nosso país significaria uma perda de posicionamento, de destaque e desenvolvimento do Brasil, voltando a uma posição subalterna.

Parecer da Comissão do Ultramar sobre ofício do Governador da Baía, informando da falta de adesão à monarquia constitucional e à necessidade do envio de tropas
Parecer da Comissão do Ultramar sobre ofício do Governador da Baía, informando da falta de adesão à monarquia constitucional e à necessidade do envio de tropas. 10 de julho de 1821.
Cota AHP: Secção I/II, cx. 111, mç. 74, doc. 60

Desta forma, após a eleição de Deputados para as Cortes Gerais, Extraordinárias e Constituintes de 1821-1822, algumas províncias recusaram-se a reconhecer a soberania de Portugal, das Cortes Constituintes e, mais tarde, a jurar a Constituição. Por forma a garantir a estabilidade social e política em províncias rebeldes, como Baía e Pernambuco, Portugal enviou para essas regiões tropas, não conseguindo, porém, evitar confrontos com os movimentos dissidentes brasileiros.

No decorrer deste processo, Portugal pediu também a D. Pedro IV que deixasse o Brasil pois, com a nova organização daquele reino em juntas provisórias de governo em cada província, já não se justificava a sua presença naquele território. Tal não foi bem aceite em alguns setores da sociedade brasileira, os quais se organizaram, formando movimentos de resistência e pedindo a D. Pedro IV que ficasse. Assim, em 9 de janeiro de 1822, chegou-lhe uma petição com mais de 8000 assinaturas para que não abandonasse o Brasil. Este dia ficou conhecido como o Dia do Fico, pois foi quando D. Pedro disse que não regressaria a Portugal.

Face a este movimento de rebelião, os decretos das Cortes para regular a nova forma de gestão do Brasil não foram totalmente aceites e cumpridos. Como reação, foi criada a Comissão dos Negócios Políticos do Brasil, com o objetivo de analisar o não cumprimento desses mesmos decretos e avaliar a extensão da rebelião naquele território.

Parecer da Comissão dos Negócios Políticos do Brasil pedindo o adiamento sobre a resolução a dar a uma representação apresentada pela Junta de São Paulo, até obter confirmação das notícias sobre a situação política naquele país
Parecer da Comissão dos Negócios Políticos do Brasil pedindo o adiamento sobre a resolução a dar a uma representação apresentada pela Junta de São Paulo, até obter confirmação das notícias sobre a situação política naquele país. 22 de março de 1822.
Cota AHP: Secção I/II, cx. 83, mç. 51, doc. 13
Indicação da deputação da província de S. Paulo, propondo revogação dos decretos das Cortes que organizam as juntas provisionais, ordenam a retirada de D. João VI para Portugal e extinguem os tribunais. 31 de maio de 1822.
Cota AHP: Secção I/II, cx. 120, mç. 82, doc. 4

No final de 1821, as Cortes ordenaram a D. Pedro IV que regressasse a Portugal e colocaram-no como governador da província do Rio de Janeiro. D. Pedro remodelou o Ministério dos Negócios do Reino do Brasil, em 16 de janeiro de 1822, sob a liderança de José Bonifácio de Andrada e Silva e deliberou que as determinações vindas de Portugal apenas fossem implementadas após verificação prévia de D. Pedro. Em 3 de junho de 1822, D. Pedro IV convocou a Assembleia Nacional Constituinte, com a finalidade de elaborar uma Constituição para o reino do Brasil, antes da sua independência política. As Cortes decretaram ilegal a Assembleia Constituinte reunida no Brasil, assim como o Governo criado por D. Pedro e ordenaram o seu regresso imediato a Portugal.

Requerimento de Deputados representantes das províncias do Brasil solicitando que as Cortes desaprovassem a proposição, apresentada pelo Deputado Moura, por referir que a capital do reino seria sempre em Portugal. 8 de julho de 1822. Cota AHP: Secção I/II, cx. 60, mç. 34, doc. 217
Parecer da Comissão de Constituição sobre indicação de Deputados da província da Baía, declarando que não poderiam continuar a ser representantes daquela província, contudo, caso esta proposição não fosse aceite, eles não se julgariam autorizados para espontaneamente assinar e jurar a Constituição. 16 de setembro de 1822. Cota AHP: Secção I/II, cx. 11, mç. 7, doc. 234

Manifesto do Príncipe Regente, D. Pedro IV, aos povos do Brasil, declarando a independência daquele reino. 1 de agosto de 1822
Manifesto do Príncipe Regente, D. Pedro IV, aos povos do Brasil, declarando a independência daquele reino. 1 de agosto de 1822.
Cota AHP: Secção I/II, cx. 96, mç. 62, doc. 127

Em 1 de agosto de 1822, D. Pedro IV fez o Manifesto aos povos do Brasil, em que declarava a independência do território brasileiro, independência essa efetivamente marcada em 7 setembro de 1822, quando, nas margens do rio Ipiranga, na cidade de São Paulo, o então ainda príncipe regente bradou: "Independência ou Morte!".

Projeto de Decreto n.º 301 que anulava os atos legislativos do Governo do Rio de Janeiro. 24 de setembro de 1822
Projeto de Decreto n.º 301 que anulava os atos legislativos do Governo do Rio de Janeiro. 24 de setembro de 1822.
Cota AHP: Secção I/II, cx. 39, mç. 22, doc. 90

Face a este posicionamento, as Cortes tomaram medidas mais fortes no sentido de tornar ilegais os atos cometidos no Brasil que corroboravam a sua independência.

Não obstante, em 12 de outubro de 1822, D. Pedro foi aclamado imperador do Brasil. A separação oficial de Portugal deu-se em 1 de dezembro de 1822, com a sua coroação como imperador.

Esta declaração de independência era unilateral, pelo que Portugal continuava a não reconhecer a soberania do território brasileiro e as Cortes continuaram a produzir legislação como se ainda tivessem uma voz ativa sobre o país.

 
Projeto de lei que determinava que a regência do Brasil se estabelecia provisoriamente na cidade da Baía. 17 de dezembro de 1822.
Cota AHP: Secção I/II, cx. 89, mç. 56, doc. 87
Projeto de Decreto n.º 54 que declarava rebeldes todas as províncias do Brasil que «espontânea e livremente desobedecem à Constituição e leis da Monarquia Portuguesa ou reconhecem o rebelde Governo do Rio de Janeiro». 14 de janeiro de 1823.
Cota AHP: Secção I/II, cx. 39, mç. 22, doc. 91

O próprio ambiente social e político em Portugal não era muito estável. Em 1823, deu-se a Vila-Francada, o regresso do absolutismo e as Cortes Ordinárias foram encerradas, reabrindo em 1826. Foi apenas em 29 de agosto de 1825 que Portugal reconheceu a independência do Brasil, com a assinatura do Tratado de Paz e Aliança, entre D. João VI, rei de Portugal, e D. Pedro I, imperador do Brasil, seu filho.

Autoria: Catarina Serafim (Arquivo Histórico Parlamentar)




[1] Para conhecer melhor o trabalho das Cortes Gerais, Extraordinárias e Constituintes de 1821-22, assim como o trabalho destas comissões especiais, consultar o Guia do Fundo das Cortes Constituintes de 1821-1822