A Assembleia da República, no quadro das Comemorações do Bicentenário do Constitucionalismo Português, organiza uma mostra documental dedicada à Constituição de 1822. Em complemento a esta iniciativa, o presente dossiê digital reúne documentação pertencente à coleção da Biblioteca Passos Manuel, disponibilizando um conjunto de fontes para investigadores ou interessados em conhecer este período decisivo para história política portuguesa.
A Revolução Liberal de 1820 surgiu do desejo de implantação de uma nova ordem social e política, e de uma nova relação entre governantes e governados, regulada por uma lei fundamental: a Constituição. A identificação dos males do País, e o apelo à sua superação pela intervenção das Cortes, alimentou a produção editorial, em alguns casos com assinalável sucesso de mercado, como parece atestar o caso da obra do magistrado e jurisconsulto (e também deputado às Cortes Constituintes) Manuel Borges Carneiro, publicada sob o pseudónimo de D. C. N. Publícola, Portugal Regenerado em 1820, que conheceu 3 edições no mesmo ano. Outros autores, como o médico e censor do Desembargo do Paço Francisco José de Almeida, na obra Introducção à convocação das Cortes, orientam o seu contributo para a definição do modo de organizar a representação nacional e de redação da lei fundamental.
O início dos trabalhos parlamentares teve lugar no dia 26 de janeiro de 1821, e fica espelhado no Diário das Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação Portugueza, que podem ser consultadas em https://debates.parlamento.pt/catalogo/mc/c1821. Competia às Cortes a prossecução de dois objetivos principais: a elaboração e aprovação das Bases da Constituição, o que aconteceu logo em 9 de março de 1821; a elaboração e aprovação da Constituição Política da Monarquia Portuguesa, o que aconteceu em 23 de setembro de 1822, sendo acolhida com júbilo popular. Até à adoção do texto constitucional definitivo, as Bases da Constituição vigoraram provisoriamente, como documento norteador da atividade legislativa que as mesmas Cortes também assumiram, o que justifica a sua designação como Cortes Gerais, Extraordinárias e Constituintes.
«A Constituição protege os Direitos do homem, e não só he a sua mais segura garantia, mas estabelece, e fixa em vigor de Leis esses mesmos Direitos.» (Introducção à convocação das Cortes…, p. 9). Mas a nova ordem instituída assentava em direitos e deveres. Para o cidadão, «o seu primeiro dever he ser fiel á Constituição, mostrando em toda a parte, que he hum exacto observante, das leis, que nella se contem; e estando prompto, e resoluto a sustenta-la com todas as suas forças, e defende-la corajosamente contra todos aquelles, que pretenderem impugnala.» (O Cidadão Lusitano, p. 8). Porque «…não basta termos a lei, e huma lei perfeitíssima: não basta tornamos a dizer… he precizo, que a olhemos como huma peça composta de diversas mollas, e que huma vez que estas não trabalhem ao mesmo tempo na direcção propria, e relativa á molla principal, será o mesmo, que termos tido hum trabalho extemporaneo; a molla principal da grande maquina he o Corpo Legislativo: a maneira de tornar esta em perfeita liberdade de obrar, he o respeito que os Povos devem ter ao Legislador.» (Campeão Lisbonense, 25 set. 1822, p. 1). Este primado da Lei impunha uma pedagogia para uma nova cidadania, de que apresentamos dois exemplos.
A liberdade de imprensa foi consagrada no ordenamento jurídico nacional logo em 12 de julho e 1821. Já antes, nas Bases da Constituição, o princípio 8 preconizava que «a livre comunicação dos pensamentos he um dos mais preciosos direitos do homem. Todo o cidadão póde conseguintemente, sem dependencia de censura prévia, manifestar suas opiniões em qualquer materia; com tanto que haja de responder pelo abuso desta liberdade nos casos e na forma que a lei determinar» (p. 3), o que é reiterado no texto definitivo da Constituição. É normal, por isso, que a imprensa periódica tenha dedicado muitas das suas páginas ao escrutínio do processo político.
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