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Sufrágio Universal (1918)


PORTUGAL. – Sufrágio universal : decreto n.º 3.907 e diplomas subsequentes de carácter eleitoral. Lisboa : Imprensa Nacional, 1918. – cota 76/18

A afirmação da universalidade da capacidade eleitoral ativa dos cidadãos e cidadãs portugueses traduziu-se num processo, com avanços e recuos, só concluído após a Revolução de 25 de Abril de 1974. Até então, questões de género, literacia, capacidade económica ou de ocupação socioprofissional iam operando flutuações no universo de eleitores.

Tomemos como exemplo o curto período de 16 anos da I República Portuguesa, que conheceu cinco leis eleitorais.

A primeira, logo em 1911, reconhecia o direito de voto a todos os “cidadãos maiores de 21 anos que soubessem ler e escrever ou fossem chefes de família”. Excluindo a questão da literacia (que só por si arredava dos cadernos eleitorais uma percentagem esmagadora da população, na qual o analfabetismo era reinante), a não inclusão da restrição por motivo de sexo acabou por ser assumida como um “lapso formal” na lei, bem conhecido pelo episódio que envolveu Carolina Beatriz Ângelo, a primeira eleitora portuguesa, que mesmo assim só após recurso em tribunal conseguiu ver aceite o seu requerimento de inclusão no recenseamento eleitoral.

A situação foi rapidamente corrigida, na nova lei eleitoral de 3 de julho 1913, que veio restringir a capacidade de voto a cidadãos do sexo masculino maiores de 21 anos que soubessem ler e escrever. Ficaram, assim, adiadas as aspirações das sufragistas portuguesas.

O documento que apresentamos, que reúne o Decreto n.º 3907, de 11 de março de 1918, e diplomas subsequentes reguladores das eleições para Presidente da República, Deputados e Senadores, apresenta-se com o título Sufrágio universal. Mas a expetativa criada pelo título e pelo parágrafo de abertura – “O presente decreto realiza uma aspiração do antigo partido republicano português, em cujo programa, elaborado em 11 de Janeiro de 1891 […] expressamente se consignava, entre as liberdades políticas, ou de garantias, o sufrágio universal” – é prontamente desmentida pela passagem seguinte: “Assim, serão eleitores, dos cargos políticos e administrativos, todos os cidadãos portugueses, do sexo masculino, maiores de 21 anos, que estejam no gozo dos seus direitos civis e políticos e residam em território nacional há mais de seis meses.”

O alargamento do universo de eleitores fazia-se, assim, pela inclusão de eleitores analfabetos, cifrados, segundo o diploma, em cerca de 70% da população, e resultava na profunda crença de adesão das massas ao ideal republicano.

Acreditava o legislador que “o veredictum do sufrágio universal não lhe será hostil. Os povos dignos de viver sabem sempre encontrar o caminho da salvação pública. Nem se diga que o iletrado é incapaz de escolher quem legitimamente o represente. Curta é a distância que separa o analfabeto do semi-iletrado e facilmente suprível por um sólido fundo de bom senso e hábitos de trabalho. Em sete anos que o regime conta, nunca o analfabeto lhe perturbou a marcha, e antes à sua admirável e obstinada resistência aos agentes perturbadores da atividade nacional se deve, em grande parte, a ordem relativa em que temos podido viver.”

O diploma enumera todos os excluídos do processo eleitoral: “as praças de pré do Exército e da Armada”; “os alienados e bem assim os interditos por sentença com trânsito em julgado, da regência da sua pessoa e da administração de seus bens”; “os falidos, enquanto por sentença com trânsito em julgado não forem reabilitados”; “os que estiverem pronunciados por despacho com trânsito em julgado e os privados do exercício dos seus direitos políticos por efeito de sentença penal condenatória”; “os que tiverem sido condenados como vadios, dentro do prazo de cinco anos, a contar da data da respetiva sentença.”

Em relação às mulheres, não há uma palavra justificativa da sua exclusão, nem tão pouco são enumeradas nos grupos excluídos. O resto da publicação reúne diversas portarias que esclarecem dúvidas suscitadas pelo Decreto. A Portaria n.º 1.308, de 17 de abril, faz a única menção ao sexo feminino, objetivando expressamente a sua incapacidade para exercer o direito de voto (a par de indivíduos de nacionalidade estrangeira), e declarando que a infração desta disposição determinaria a nulidade da respetiva eleição.

Só em 1931 as mulheres veriam o seu direito de voto reconhecido e, mesmo assim, limitado às detentoras de cursos secundários ou superiores.

Esta publicação pode ser consultada em formato digital.