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Comentário à Lei do Divórcio de 1910


FERREIRA, Henrique Vaz – Commentario à Lei do Divórcio
FERREIRA, Henrique Vaz – Commentario à Lei do Divórcio : (Decreto de 3 de novembro de 1910). Lisboa : Aillaud, Alves, Bastos & C.ª, [1911]. 240 p. Cota: 39/11.

O livro que hoje apresentamos entrou na coleção da Assembleia da República no dia 20 de julho de 1911, como se lê na dedicatória à Assembleia Nacional Constituinte, manuscrita pelo autor, Vaz Ferreira, que se apresenta na página de rosto como «advogado e contador da 1.ª vara cível de Lisboa». Trata-se de Henrique Vaz de Andrade Bastos Ferreira (1868-1961), que se distinguiu também como jornalista, político e alto quadro da administração (deputado regenerador eleito pelo círculo de Coimbra na legislatura de 1901-1904, governador civil de Aveiro entre 1906 e 1910, e chefe do gabinete do Ministro da Justiça a partir de 1920).

«Este comentário», esclarece o autor, «não é mais do que um despretensioso apontamento de indicações práticas sobre a lei do divórcio, decretada pelo Governo Provisório da República Portuguesa, em 3 de novembro de 1910». Concluímos ter sido produzido num tempo recorde, provavelmente menos de 6 meses, antes mesmo de a referida lei ser revista, conforme previsto, pelas Cortes Constituintes.

Esta medida, com impacto profundo no regime da família em Portugal, acontece menos de um mês após a implantação da República, perfeitamente integrada no sentido progressista da autêntica torrente legislativa produzida pelo novo regime, muita dela com claro sentido social. Com efeito, o Decreto de 3 de novembro vinha consagrar, em matéria de dissolução do casamento, uma alternativa à morte do cônjuge – o Divórcio –, e criava um quarto estado civil – o de divorciado. Reproduzindo as palavras do autor, «o divórcio foi um estilhaço benéfico da revolução, que veio partir algemas e efetivar liberdades, desejadas com aquele incertíssimo anseio de quem só da morte espera alívio. O divórcio não tirou direitos a ninguém, libertou muitos desgraçados. O divórcio não veio ferir interesses, quebrou longas tiranias.»

Talvez por esse motivo, o autor considera que «o divórcio não teve em Portugal uma oposição violenta», ou pelo menos oposição semelhante à que conheceu o reconhecimento do casamento civil: «Não houve um protesto válido. Nem mesmo as feras da reação puderam rosnar, embaraçadas com a expulsão dos coios e congregações». Por isso também, considera que a propaganda a favor do divórcio foi fácil, destacando o esforço de três individualidades no processo que terminaria com a promulgação da lei: Roboredo Sampaio e Melo, deputado, que em 1 de março de 1900 apresentou no parlamento um projeto de lei estabelecendo o divórcio, iniciativa que renovou em 19 de maio de 1908 e em 26 de julho de 1909; Luís de Mesquita, advogado do Porto, que defendeu o divórcio numa série de conferências, e publicou um cauteloso e moderado projeto de lei do divórcio, aquém da «largueza radical» das doutrinas que defendia, e que em muito iria servir como base do Decreto que acabou por ser aprovado; e Alberto Bramão, que fez o seu trabalho de propaganda nos jornais.

O livro desenvolve-se com notas extensas a cada um dos 70 artigos do Decreto, onde o autor faz uso de técnicas de legislação comparada, abordagem diacrónica, contextualização política e social, recurso a jurisprudência e articulação do diploma com a restante legislação, não se eximindo de análises críticas tendentes à melhoria da qualidade da lei. Trata-se, por isso, de um importante contributo para entender não só o debate em seu torno, mas as condições de receção do diploma. Registe-se, para concluir, que no censo da população de 1911 (Portugal contava, então, com praticamente 6 milhões de habitantes) surgem já registados 1231 homens e 1454 mulheres divorciados.

Atendendo à data da morte do autor, e em observância do disposto no Código dos Direitos de Autor e Direitos Conexos relativamente à divulgação de obras, não é possível à Biblioteca Passos Manuel fazer a disponibilização pública da cópia digital deste livro, como é hábito nesta rubrica. O acesso ao conteúdo pode fazer-se exclusivamente na rede interna da Assembleia da República, incluindo os postos de consulta da Biblioteca.

João Carlos Oliveira